sexta-feira, 21 de setembro de 2007

O dia em que Júpiter encontrou Saturno

-Quando a noite chegar cedo e a neve cobrir as ruas, ficarei o dia inteiro na cama pensando em dormir com você.
-Quando estiver muito quente, me dará uma moleza de balançar devagarinho na rede pensando em dormir com você.
- Vou te escrever cartas e não mandar.
- Vou tentar recompor teu rosto sem conseguir.
- Vou ver Jupiter e me lembrar de você.
- Vou ver Saturno e me lembrar de você.
- Daqui a vinte anos voltarão a se encontrar.
- O tempo não existe.
- O tempo existe, sim, e devora.
-Vou procurar teu cheiro no corpo de outra mulher. Sem encontrar, porque terei esquecido. Alfazema?
-Alecrim. Quando eu olhar a noite enorme do Equador, pensarei se tudo isso foi um encontro ou uma despedida.
-E que uma palavra ou um gesto, seu ou meu, seria suficiente para modificar nossos roteiros.
(Silêncio)
-Mas não seria natural
-Natural é as pessoas se encontrarem e se perderem.
-Natural é encontrar.Natural é perder.
-Linhas paralelas se encontram no infinito.
-O infinito não acaba. O infinito é nunca.
-Ou sempre.
-Tudo isso é muito abstrato. Está tocando Kiss, kiss, kiss. Por que não me convida para dormirmos juntos.
-Você quer dormir comigo?
-Não.
-Porque não é preciso?
-Porque não é preciso.
(Silêncio)
-Me beija.
-Te beijo.


Caio Fernando Abreu

Um comentário:

Anônimo disse...

que me perdoem todos os outros.
mas este sem dúvida foi o que mais me tocou.
não se sei se foi o momento pelo qual vivo, que desacredito de toda esta loucura racional, mas isto é tudo Isa.
efemeridade é tudo o que resta e é tudo o que temos.
adorei, mesmo!!!

diálogos ricos de entrelinhas, e aqueles alinhavos que nunca findam...aahhh sêsse.