Ele sempre fora charmoso.
Tinha lábia de galanteador e gingado de malandro tipo zé carioca com chapéu Panamá.
As garotinhas caiam aos seus pés porque gostavam, mesmo que inconscientemente, de uma fuga relativamente rápida do estereotipo de homem bonito.
Ele se divertia. Devorava corações e cuspia pedaços de seu pulmão degradado pelo cigarro.
Ela era um tanto tímida.
Cortara os cabelos como um sinal de rebeldia latente que queria avisar ao mundo que estava chegando. Tinha os dentes amarelados por culpa do café e a pele branca por falta de melanina.
Os garotos a enxergavam como um amigo e o amor de sua vida até então tinha sido um vizinho pequeno e gordinho, que a tratava como uma mulher. O único.
Ela o adorava e pensava ser inteiramente feliz. Talvez o fosse mesmo.
A cidade não tinha muita diversão.
Eram sempre as mesmas pessoas, nos mesmos lugares, falando sobre os mesmos assuntos chatos sobre as vidas das mesmas pessoas chatas que frequentavam os mesmos lugares chatos.
Os horizontes dele foram abertos há tempos... os dela ainda estavam em estágio fetal.
Se trombaram por acaso num misto de tédio e amigos em comum enquanto o caos seguia indiferente e as pessoas iam pra casa depois do trabalho ainda embaixo de sol por causa do horário de verão.
Era comum chover. Ele sempre chegava molhado e ela sempre estava esperando há algum tempo.
Nunca combinaram nada. Tudo corria naturalmente; sem pressão, sem pressa, sem ritmo.
Ela aprendera alguma coisa sobre livros e ele estava descobrindo como era se prender a alguém.
Era uma troca de favores sem o peso de denominação alguma.
Eram, por si, sós e agora estavam juntos.
Eles mudaram um bocado com o passar do tempo.
Cresceram na mesma proporção grande e harmoniosa de um casal de linhas paralelas que por ventura se trombavam no infinito repleto de qualquer coisa.
Ele sempre teve outras. Ela, por vezes, também.
Mas isso não importava. Não muito. Não pra eles.
E como dizia alguma dessas escritoras de livros de banca de jornal, entre eles o ar tinha gosto de sábado, e eles deveriam ter sido mais espertos guardando toda aquela luz pra eles, pois ela acabou cegando os pobres de coração e doentes de espírito; e como se fosse uma regra que nunca tem uma excessão, eles foram cancelados.
As cortinas baixaram e a plateia ovacionou o fim do espetaculo que nem teve tempo de atingir o ápice.
Não haveria mais mocinho e mocinha, nem grandes beijos cinematográficos ou cenários encantados.
Hoje cada um tem sua vida. Cada um tem sua estrada.
É certo que um dos dois ainda pensa que os caminhos voltem a se cruzar em algum trevo de quatro folhas e enquanto isso não acontece, as pessoas que compraram os ingressos da primeira fila pedem autógrafos físicos aos personagens principais para que eles não tenham tempo de encenar um novo romance entre eles.
Só queria deixar claro, pra qualquer telespectador dessa cronica entre duas pessoas que simplesmente se encontraram em um momento de solidão e liberdade e resolveram se completar sem fazer mal há ninguém, que essa historia ainda terá seu grand finale.
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