segunda-feira, 14 de julho de 2008

um trecho

O homem mais sábio que conheci, Fermín Romero de Torres, me havia explicado certa ocasião que não existia na vida experiência comparável à primeira vez em que se despe uma mulher. Sábio como era, ele não havia mentido, mas também não havia me contado toda a verdade. Não dissera nada sobre aquele estranho tremor das mãos que transformava cada botão, cada silêncio, em uma tarefa de titãs. Nada dissera sobre aquele feitiço de pele pálida e trêmula, sobre aquele primeiro roçar de lábios, nem sobre aquela alucinação que parecia arder em cada poro da pele. Nada me contou sobre tudo aquilo, porque sabia que o milagre só acontecia uma vez e que, ao fazê-lo, falava uma linguagem de segredos que, assim que eram descobertos, desapareciam para sempre. Mil vezes quis recuperar aquela primeira tarde com Bea no casarão da Avenida del Tibidabo, quando o barulho da chuva levou o mundo para longe. Mil vezes quis voltar e perder-me numa lembrança da qual só posso resgatar uma imagem roubada ao calor das chamas. Bea, nua e reluzente de chuva, deitada junto ao fogo, com olhos que desde então me perseguem. Inclinei-me sobre ela e acariciei a pele de sua barriga com as pontas dos dedos. Bea baixou os cílios, os olhos e me sorriu, segura e forte.
- Faça o que quiser comigo - sussurrou ela.
Tinha 17 anos e a vida nos lábios.


A Sombra do Vento
pag. 201

Um comentário:

Anônimo disse...

caeiro

lindíssimo...