quarta-feira, 28 de novembro de 2007

vícios e virtudes

João já estava quase todo calvo e, por isso, orgulhava-se de seus últimos fios de cabelo, os quais penteava frenética e roboticamente todas as manhãs, em frente ao espelho semi-embaçado depois do banho quente de todos os dias.
Maria só usava vestidos abaixo do joelho há um bom tempo. Pintava os cabelos de cinza pra não tê-los todos brancos. Maquiagem forte pra esconder as rugas de toda uma vida. Fazia um arroz como ninguém.
Ele dormia sentado no sofá, esperando pelo café da manhã que Ela fazia com todo o amor.
Se conheceram no bingo. João foi jogar, porque já tinha bebido demais, e Maria era uma velha viciada que estava lá todos os dias e dava em cima de todo velhote que ganhava mais na noite. Naquela noite, o 'felizardo' foi João.
Ela, como sempre, pagou-lhe um drink e o levou prum motel.
Fizeram amor a noite toda, como animais. Gritavam, bêbados - compraram muitas garrafas de alguma coisa com o dinheiro que João ganhou na noite.
Depois, ele pagou uma café da manhã reforçado pra desconhecida.
Maria, sem querer, apaixonou-se pelos olhos azuis de João... e ele, pelas coxas firmes de Maria, que mesmo aos 62 anos estava "em forma".
Resolveram largar a vida que levavam e foram morar na casa dele, já que ela vivia com a familia a filha.
João trabalhava no banco há uns 40 anos e não aguentava mais, mas, por causa da imensa burocracia, não conseguia aposentar-se. Sem filhos, ou qualquer outra pessoa que pudesse sustentá-lo, trabalhava, mesmo tendo já 65 anos e uma vista debilitada.
Maria recebia uma pensão pela morte do marido, causada por um vazamento de produtos químicos de alguma empresa.
Viviam em perfeita harmonia. Maria adorava gatos; eles tinham uns 4. João gostava de bermuda com elástico, por achá-las mais confortáveis; Maria não ligava se eram feias demais.
Faziam compras no supermercado, tomavam suco natural todos os dias e passavam a tarde conversando sobre o céu, ou os pássaros, ou o jardim.
A noite era sempre o mesmo ritual; A janta, os dentes, o copo d'água e o beijo de boa noite.
Com o tempo já não sentiam mais tesão um pelo outro, mas estavam seguros ali. Certos de que morreriam juntos, não conseguiram mais se separar. Viviam uma grande mentira por comodidade, por conforto, por conformismo.
Maria falava que ia à missa e João dizia que ia jogar baralho na casa do vizinho, que era um pastor de igreja evangélica carrancudo.
Ele tentava não ficar muito bêbado e ela procurava não gastar todo o dinheiro.

Um comentário:

Anônimo disse...

se vc achar que to começando a ficar assim daqui um tempo, por favor, me mate.

rs.